quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Linguagem não se justifica - Paulo Leminski

"Leminskiando"

Leminski e a (in)utilidade da poesia


Simplesmente, Leminski

A lua no cinema (Paulo Leminski)


A lua foi ao cinema,
passava um filme engraçado,
a história de uma estrela
que não tinha namorado.

Não tinha porque era apenas
uma estrela bem pequena,

dessas que, quando apagam,
ninguém vai dizer, que pena!

Era uma estrela sozinha,
ninguém olhava pra ela,
e toda a luz que ela tinha
cabia numa janela.

A lua ficou tão triste
com aquela história de amor,
que até hoje a lua insiste:
- Amanheça, por favor!



 Lemisnki e a poesia etária

Barthes e a morte do autor


Patrícia Adriana Corrente

           Num contexto de escritura de uma obra literária, a ideia de morte do autor remete à destruição de toda voz, todo sujeito subjetivo que ressoa pelos ouvidos da escrita. A partir do momento em que o autor morre, a obra inicia sua própria escritura. Para que isso ocorra, o autor deve ser encarado como um mediador da escrita e não como autor daquelas palavras.
            Porém, ele ainda é muito solicitado em biografias, entrevista e na consciência dos literatos que teimam em juntar a pessoa e a obra, busca-se ainda uma ’explicação’ da obra como se apenas a voz do autor ressoasse na obra. Mallarmé na França iniciou o trabalho de dar à língua e à linguagem o seu lugar na confecção de uma obra literária, dando ao autor uma impessoalidade. Proust não se doou em suas obras, mas retirou dos romances sua própria vida.
            Com o Surrealismo, a ideia de autor teve pouca importância, ao subverter o código (língua), a escrita era menos formal, mais automática, menos inspiradora, fruto de uma experiência coletiva, de vários “eus”. Partindo para um argumento linguístico onde é visto que a enunciação fala por si só, sem que haja a necessidade de preenchê-la com a pessoa do interlocutor, perde-se a “pessoa” e ganha-se o “sujeito” e este basta para a linguagem, o que acaba também por “matar” o autor.
            Quando se acredita no autor, levando em conta uma concepção temporal, vê-se nele um passado que vive antes de sua obra, a relação entre obra e autor é a de um pai para seu filho, e já no texto moderno o autor é visto como alguém que nasce com sua obra, ele existe no tempo da enunciação do texto, o texto é escrito aqui e agora, nesse sentido a escrita não é mais uma espécie de registro biográfico do autor.
            O texto é um emaranhado de outros textos que conversam entre si para não produzir um sentido único, mas vários. Ele é composto por várias citações extraídas das muitas culturas, o que o texto diz pelas mãos do escritor é sempre o que já foi dito em algum momento sempre anterior, e sua fala nunca é original. Dar autoria ao texto é dar-lhe um único significado, uma explicação. A partir do momento em que se crê na escritura múltipla, não há nada para ser decifrado, não há segredo a ser descoberto e por fim ocorre a recusa a "deus".
            O texto é a fonte de várias escrituras, de várias vozes que dialogam entre si e se reúnem num só lugar, que não é o do autor, mas o do leitor, este que também traz as suas escritas e suas leituras, a unidade do texto está em seu destino: o do ouvinte final. Pouco se deu importância à figura do leitor, mas muito à figura do autor. Com a morte do autor, nasce o leitor.

Referência:
BARTHES, Roland. O Rumor da Língua. A morte do autor.

Realismo, Naturalismo e Parnasianismo


           Patrícia Adriana Corrente

             O século XIX foi o de maior riqueza cultural no Brasil, Realismo e o Naturalismo são movimentos dessa época, porém já se viu realismo na Bíblia e em Homero antes de aparecer em Balzac, por exemplo. Esses dois períodos são vistos como “homogêneos”, mas tem características do romantismo e também do simbolismo, isso se explica porque no XIX houve uma grande recusa à periodização precisa. As escolas mais diversas acabam por se assemelhar devido a outros motivos, pelas transformações que aqui ocorreram terem sido o reflexo de ideias estrangeiras.
            O Romantismo se prolongou por tempos após o século XIX, ele em contrapartida ao Classicismo, promove essa oscilação entre objetividade e subjetividade, porém nesta época o que teve realmente lugar foi a tríade Realismo-Naturalismo-Paranasianismo, grupo este que reagiu contra o apelo romântico, tendo como inimigo o grande filho do Romantismo, o Simbolismo.
            Devido aos estudos de cunho científico, os homens deste século se voltaram para a devoção às coisas materiais, a teoria de Darwin tornou-se uma religião, o mundo se tornou mecânico devido à ascensão da indústria, e as ideias do livre pensamento com relação à religião tornaram-se uma constante. As ciências sociais se aliaram às biológicas e naturais, trabalhando juntas em estudos dos fatos humanos e sociais.
            No século XIX, as ideias que reinavam eram as do iluminismo, liberalismo, positivismo, naturalismo, contra-espiritualismo e da ciência e do progresso, uma ebulição do materialismo. A teoria da evolução darwiniana fez da biologia a mola propulsora do pensamento do homem desta época, mudando concepções e métodos, transformando–os num sentido naturalista. A partir desta teoria os homens passaram a ser vistos como células reunidas num grande composto, a sociedade.
            No que tange à literatura, “realista’ deriva de real, encarar os fatos tais como o são na realidade, opondo-se ao idealismo no romantismo, essa corrente apresenta em suas obras as características dos opostos: bem e mal, beleza e feiúra, rudeza e requinte, isso pelo compromisso com a verdade, com o que existe e que é palpável.
            Realismo é antes de tudo uma tendência, um estado de espírito e não algo estanque, acabado. Apresenta a verdade, tem como característica a verossimilhança, foge do sentimentalismo e do artificial, idealizado. Faz o retrato real de seus personagens, estes que são humanos, completos, têm vida, emoções reais e não artificiais e forçadas como se vê no período romântico. No realismo não ocorre intromissão subjetiva do autor em seu texto, ele não infere seus sentimentos nos dos personagens, essa escola retrata a vida tal como ela é. Os homens e seus conflitos são seus principais assuntos, proporcionando uma precisão e fidelidade ao real. A narrativa “real” é minuciosa, dá ênfase à caracterização ao invés da ação e sua linguagem é a mais próxima da realidade.
            O Naturalismo é visto como o realismo acrescido de uma visão materialista do homem do homem e da sociedade, isso amparado pela cientificidade. Para a literatura esse período se vale dos métodos de observação e experimentação no trabalho dos fatos e das personagens, agora o homem não é estudado de maneira abstrata, mas como objeto das leis físico-químicas e influenciado pelo meio que vive. Nas obras naturalistas as camadas mais baixas da sociedade são um dos grandes assuntos dos escritores, a sociedade não mais idealizada, romântica e muito mais do que real, escancarada.
            São características desse polêmico momento literário: o amor pela natureza e pela beleza natural, a fidelidade ao natural, uma ideia naturalista da vida, o homem em seus aspectos fisiológicos, semelhança do homem ao animal desprovido de razão. O homem é o objeto do naturalista, que é observado como um “caso” a ser analisado, impessoalmente e objetivamente, ele e seu meio são vistos como realmente são e não influenciados pela ótica do subjetivo. A vida, para o naturalista, é o reflexo do movimento de forças mecânicas sobre os homens, que resulta nos atos, caráter e destino dos mesmos. Este movimento não durou mais do que a década de 80 do século XIX.
            O Parnasianismo foi o movimento referente à poesia na época da prosa realista-naturalista. Esse movimento objetivista concentrou-se num apelo à forma, à técnica, contrário à inspiração e ao essencial romântico, ou seja, a “arte pela arte”.
            A França teve grande influência cultural no Brasil, trouxe, além de outras, as ideias modernas do século XIX, influenciadas pelo Iluminismo, tinham tendências racionais, materiais de libertação do pensamento. A maçonaria foi um instrumento de grande força na propagação desses ideais, favorecendo até a circulação de livros que foram censurados por órgãos de censura no Brasil. Os jovens que frequentavam os centros de cultura, academias e universidades do Brasil, em sua grande maioria, tinham contato com os grandes centros de cultura europeus, o que favoreceu a disseminação dos ideais de racionalismo, anticlericalismo, materialismo e laicização, os grandes focos de propagação dessas ideias foram São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Bahia. Esse pensamento moderno atingiu também a América Espanhola e Portugal.
            Nessa época de modificação, o autor português Eça de Queiroz teve grande influência no Brasil literário. Suas obras “O Crime do Padre Amaro” e “O Primo Basílio” foram um dos ícones da estética realista-naturalista. A influência de Eça se dá na temática, maneira, estilo e na ironia, isso se verifica nas obras posteriores às duas já citadas, como por exemplo “O mulato” de Aluísio de Azevedo.
            O Brasil sofreu grandes modificações nessa época de transição, a civilização que antes era agrária e latifundiária se tornou burguesa e urbana, em processo de industrialização. Nesse processo já se vê o homem urbano e proletário, as transformações no âmbito da antropologia social deram-se pela abolição da escravatura.
            Quanto ao realismo no Brasil é possível descriminar certos padrões: o padrão biográfico, onde se dá maior importância à caracterização dos personagens e à descrição de sua vida, fazendo com que o protagonista seja enaltecido, o que é a intenção do ficcionista realista; o padrão regional, onde traços de uma região são caracterizados; o padrão ambiental, um quadro geográfico é aí representado, e o padrão psicológico, onde ocorre a resolução de uma situação subjetiva. As temáticas dessa escola foram os problemas sociais e o regionalismo, caracterizado pela dureza e da vida rural brasileira e a desesperança e o desencanto. O regionalismo é visto como a vitória da natureza sobre o homem.
            Esse período da literatura foi marcante no processo de nacionalização da literatura, a visão da realidade brasileira trouxe também a valorização da pátria e do que é nosso. Como gênero literário, o romance se moldou perfeitamente à proposta realista, mas assim como no Naturalismo, o conto e o teatro também encontraram refúgio. Dentre os inúmeros autores, é de suma importância citar Machado de Assis e Raul Pompéia, que além de realistas são também naturalistas 

Por uma Literatura Nacional - Histórico




Patrícia Adriana Corrente

A Literatura Nacional, passou por várias fases para chegar até os dias de hoje, sempre na busca de uma identidade própria, não uma cópia do modelo europeu, ou estadunidense mas sim uma literatura tupiniquim, de nossa gente, com nossas experiências, enfim, uma literatura que reflita a realidade brasileira. Nesse trabalho vamos levantar três fases da literatura e abordar as várias formas em que se defendeu a literatura nacional.

                     
                       INDIANISMO

Nessa primeira fase do modernismo, a necessidade de uma literatura original e nacional fez com que os escritores adotassem um “herói”, nesse caso o Índio, uma inegável parte da sociedade, um ser de nacionalidade pura, bom por natureza e por origem, embasados nos moldes europeus. Mas se pode notar que, eles não tiveram a preocupação em trazer o negro para os escritos, pois todos os homens da sociedade daquela época os consideravam sem-alma, não humanos e valorizá-los poderia ser considerado um crime, e tinham pelo índio uma certo apreço.
O Indianismo não erá só um movimento de reação nativista, mas além disso, de autonomia, de busca pela nacionalidade, após a Independência, o índio era livre na visão dos indianistas, ao contrário do negro que servia apenas ao trabalho, é um tanto quanto contraditória essa tese de que se deve valorizar o índio perante a literatura e não o negro, afinal de contas, o negro foi um dos pilastres do Brasil.
Os percursores do Indianismo e, por consequência, do Romantismo foram José de Alencar, este o maior dos indianistas, e Gonçalves Dias, mas antes deles já se falava em indianismo e busca pela literatura de origem nacional, seja para combater a dominação portuguesa,  ou para uma identificação do ser de origem. O indianismo deu impulso à literatura, divulgou a literatura daqui, traduzindo essa realidade econômica e social e fundamentalmente, deu cara nova ao romantismo, antes copiado da Europa.
O interessante do movimento indianista é que teoricamente ele não passou das histórias e do desejo de intelectuais, pois o índio não obteve privilégios, pelo contrário, levando em conta os estudos, pensando em toda a história do Brasil, o Índio perdeu e muito, perdeu sua cultura, sua identidade, sua autonomia, enfim o índio fora violentado por um povo que invadiu suas terras e estuprou suas mulheres, mas elevando-o  à condição de herói apagaria toda a miséria que antes havia feito? Talvez o movimento indianista possa soar um como um pedido de desculpas.
Mas tendo pelo ponto de vista o escritor que escreve em prol de um ideal, pensamos que elevar o índio a herói foi uma necessidade de resgate cultural, visto que a cultura nacional estava nas  mãos indígenas e não nas dos colonizadores, era uma busca ao que é daqui, ao que é naturalmente brasileiro.
José de Alencar fora por muitos considerado como ofensor da história e da verdade, pois não retratou o índio sob a realidade, mas sim sob uma ótica guerreira e heróica, endeusado, porém isso não afetou o prestígio que o autor obteve, a preferência de suas leituras são as que tratavam do indígena, sem dúvida. Gonçalves Dias foi o melhor poeta que retratou o índio, em sua obra o indígena foi o assunto que mais tocou o leitor, Dias eternizou o índio e o incrustou na literatura .Depois desses dois autores terem retratado o índio à sua maneira lírica ou subjetiva o indianismo recaiu, dando espaço a outros temas dentro do romantismo. É certo que os índios Guarani, Iracema, do romantismo, são bem diferentes do índio moderno Macunaíma, que também tenta representar a cultura nacional, porém satiriza o próprio brasileiro, pela figura do índio-herói, anti-herói.

                       MODERNISMO

O Modernismo abrange três aspectos intimamente ligados, o primeiro é o movimento o segundo uma estética e o terceiro um período.
Em 1922, em São Paulo, ocorreu a Semana de Arte Moderna e deu-se origem ao movimento que se ramificou por todo o país, vale lembrar que esse movimento foi de ruptura, assim como o romantismo, que rompeu com o plano formal e temático da nossa literatura.
O Modernismo foi um movimento que acompanhou seu tempo, pois fazia alusão às mudanças tecnológicas do período histórico, em nossa opinião essa característica do movimento é positiva, pois retrata a realidade nua e crua e foge dos padrões antes impostos.
No entanto, o movimento não pregava que era necessário esquecer completamente o que vinha de fora, mas sim filtrar  e se apropriar do que é bom, isso se observa no Manifesto Antropofágico Esse manifesto foi um “soco na cara “ dos literatos do momento, pois foi totalmente inovador e agressivo aos que não estavam adaptados à nova tendência.
No Modernismo aparece um novo herói indígena, o Macunaíma, por exemplo, assim como no romantismo. Quando é falado no índio, ele é retratado sob um outro foco, o índio deixa de ser o guerreiro do romantismo e passa a ser o preguiçoso do modernismo,  o nacionalismo, sob essa ótica, é visto de forma negativa pois esse novo herói é uma observação desprivilegiada da própria sociedade brasileira.
Esteticamente falando, o movimento deixa de lado  o lirismo do romantismo e estabelece uma nova tendência mais livre, onde os autores expressam seus sentimentos de forma aberta e inovadora, mantendo como pano de fundo o contexto social, histórico e econômico da época. Essa prática inovadora só veio a contribuir para a literatura nacional, visto que essa forma dá liberdade tanto aos leitores quanto aos artistas, onde cada um pode retratar, pensar e analisar o que bem entender de cada obra, sem medo das repressões que poderiam vir a ser impostas pela sociedade cultural da época.
O que a Antropofagia propôs era uma não rejeição completa à cultura européia, mas sim superá-la assimilando e mastigando o que ela tem de bom, e recriando novos aspectos literários de acordo com os artistas nacionais da época, tentando, dessa maneira, superar de qualquer modo a imposição da cultura social e literária europeia do período.
                                                                                                                                                                                                                                                                                                
                         TROPICÁLIA

O Tropicalismo foi um movimento essencialmente musical, onde os estilos  eram basicamente e inteiramente de raízes brasileiras,   não pendendo, de maneira nenhuma, para as inclinações da estilística cultural e literária europeia Possuía expressão literária nacional e teve como pano de fundo a época do golpe militar, do Ato Institucional, A I 5, nos anos de 1964 a 1968. Esse Ato determinou, entre outras imposições, a censura cultural nacional.
Foi um movimento totalmente revolucionário, podendo-se dizer de “esquerda”, pois rompeu com o estilo da MPB regida pela Bossa Nova, e trouxe críticas ao governo vigente da época, visto que vários artistas foram exilados do país e proibidos de exercerem suas funções. De acordo com o AI 5, os artistas tinham que se submeter a escrever o que pensavam de maneira subliminar, cabendo aos ouvintes e leitores entender o que o autor ou artista quis estabelecer nas entrelinhas dos textos musicais, se fosse a vontade do mesmo.
Esse movimento foi de grande valor para a literatura e para a cultura do país, mas foi trágico e triste, visto que a vontade de gritar era grande, mas a censura também, cabia aos artistas calarem-se. 
As músicas Cálice, de Chico Buarque e Pra não dizer que não falei das flores, de Geraldo Vandré, são exemplos nítidos da repressão ao artista e ao movimento.
Os artistas dessa época, na maioria das vezes, estavam no auge de sua juventude, onde explodiam as ideias de reformulação da cultura e da política nacional, muitos não concordavam com a imposição governamental e desejavam o rompimento dessa repressão, tanto social quanto cultural.
A repressão prejudicou e muito o desenvolvimento da cultura, pois livros tiveram de serem publicados em outras épocas, e músicas forma banidas pela censura, tirando o privilégio da população de usufruir da boa arte ou da boa música que deixaram de serem publicadas.
Estes três movimentos de alguma maneira estão intimamente interligados, pois são sequências literárias que dependem umas das outras e defendem a literatura nacional, defendem o que é do povo brasileiro, são relatos de suas experiências, literatura de suas realidades e pensamentos e vontades a serem exprimidos nas obras que fluíram no período cultural e vigente da época.


                        BIBLIOGRAFIA:

CANDIDO A . e CASTELLO A . José, “Presença da Cultura Brasileira”, 6ª ed., Rio de janeiro – São Paulo, 1977.
SODRÉ W. Nelson, “História da Literatura Brasileira”, 5ª ed., Rio de Janeiro, 1969.

CADORE A . Luís, “Curso Prático de Português”, São Paulo, 1998.

Análise do conto A Moça Tecelã


Patrícia Adriana Corrente      


Colasanti retrata um diferente tipo de perfil feminino nesse conto, por recursos de uma fábula, a mulher independente, que constrói a cada dia seus sonhos, a mulher que se basta por si mesma, que consegue perceber a interferência negativa do homem em sua vida, e muda a situação a tempo, porém também retrata a mulher apaixonada “cega” de amores pelo seu homem, que faz seus gostos por amor, por acreditar em seus sonhos, para tê-lo ao seu lado.
A moça, no conto, é delicada, sensível, criativa, simples, não tem ganância, vive feliz em sua vida, dependendo afetivamente e socialmente só de si mesma. Ao fazer seu tempo e seu espaço, a moça traz, constrói, a necessidade de companhia, de um homem para crescer ao seu lado; ela trouxe alguém para a sua vida, um companheiro, talvez porque, a sociedade a impôs isso, a presença de um homem na vida de uma mulher, ela achou que realmente precisasse.
O homem, ambicioso, ganancioso, dominador e autoritário, entrou na vida da moça, com todos os seus desejos, não os mesmos da moça, mas, desejos materiais, não os de felicidade, mas de enriquecimento supérfluo. A moça moldou um homem para si, da maneira que viesse, usufruindo de suas qualidades e virtudes para seu bem próprio, sua satisfação pessoal. A moça, por algum tempo, submeteu-se aos caprichos do marido, fez para agradar, mas já não tinha vida, vivia para ele, perdeu sua identidade, sua autenticidade, simplicidade.
Percebeu, então, que o homem em nada havia acrescentado em sua vida, mas pelo contrario, deteve sua liberdade em se expressar, seus sonhos ele não valorizou, suas vontades ele fez como se não tivesse ouvido. A moça teve a autonomia de tomar sua vida para si, “desfez”o homem de sua vida, se impôs e voltou a sua antiga vida, onde era realmente feliz e realizada, sem a necessidade de um homem.
O homem, não a desejava, mas sim, tudo o que ela podia lhe proporcionar, lhe oferecer com seu mágico poder de tecer a vida, ele não admitiu a moça ter esse poder, não lhe cabe, o homem sentiu-se ameaçado, enclausurou-a, mas não se deu conta que ela ainda tinha consciência do que acontecia e de sua insatisfação.
A Moça tecelã é a representação da mulher autônoma, que vai à busca de seus objetivos, é o retrato da mulher que não se cala, não se acomoda e nem se submete à possível “autoridade” masculina.
Particularmente, o conto de Marina Colasanti me fez refletir sobre o amor em contraponto com a liberdade, ou seja, até que ponto um sentimento vale a liberdade,ou, o que é o amor para um é é prisão para o outro. Esse conto levanta dezenas de questões do universo feminino, dos sentimentos; do trabalho escravo, da submissão de um ser em relação a outro por prazer ou por comodidade; dos valores que cada ser tem ou não.
As grandes dualidades presentes neste conto são: liberdade/amor; valores materiais/afetividade; autonomia/submissão, tendo em vista essas dualidades citadas, verifico que a obra esta mais presente do que nunca em nossa vida cotidiana, o ser humano é um ser de contradições, é um ser suscetível a erros e a corrupção, claro que em uma abrangência maior. Não se adapta tão somente ao homem o poder de ser corrompido, mas também à mulher, porém se verifica no conto uma mulher meiga, de sentimentos puros e fraternos, de muitos sonhos e esperanças.
A situação de servidão da mulher perante ao homem, também é um fator marcante na obra, pode levar a questões sociais tão presentes no mundo de hoje, quanto antigamente, o trabalho escravo desempenhado por crianças, homens e mulheres em nosso país, e em regiões desprevilegiadas socilamente. A condição de submissão é imposta e não oferecida pelo corrupto, mas nesse conto prefiro levantar a situação de submissão de uma mulher que se carateriza por dona-de casa, a mulher que é obrigada a servir seu marido, obrigada a viver em um mundo que só é completo para ele. No desfecho do conto ocorre uma situação atípica, pois na maioria das vezes, em nossa realidade, a mulheres não conseguem se desvencilhar das amarras de um homem autoritário, vivem subjugadas aos seus caprichos, talvez por uma imposição social patriarcal ou pelo receio do novo, de uma vida independente.
Com relação, novamente, aos personagens a Moça e o Homem, verificou-se que não possuem nomes, isso nos leva a pensar que se caracterizam por tipos, representações de nossa sociedade, daí a proximidade do conto com a realidade, sucessivamente a proximidade do leitor com a obra., são seres que vivem dentro de uma fábula, poderia até dizer um conto-de fadas às avessas, mas que fazem parte da realidade de nossas vidas, Colasanti se valeu de uma fábula para representar o sentimento de muitas pessoas, as dores e talvez até o sofrimento de algumas mulheres.
O espaço e o tempo são marcantes na obra, pois eles se determinam conforme a vontade da moça, por intermédio do tear, se ela quer comer ela tece, se quer sol, ela tece, com quis uma companhia ela teceu, mas nesse momento ocorre uma ruptura, pois a partir do momento em que teceu seu homem, perdeu a vontade de tecer, pois tecia apenas os gostos de seu homem e para ele. O tear que antes era seu companheiro tornou-se instrumento do homem, para seu uso, mas com a habilidade da moça. No decorrer das leituras, verifiquei algo interessante, o espaço em que a moça é colocada pelo homem, “o mais alto quarto da mais alta torre”, se assemelha com um espaço muito conhecido e estigmatizado como feminino, a cozinha, espaço este que por muitos tempos era "único em que a mulher se sentia segura, e talvez por imposição era o espaço que mais frequentava". Assim como a moça do conto que fora submetida ao quarto no alto, longe de todos, para que ninguém soubesse do seu “poder" do tear, muitas mulheres são enclausuradas dentro de espaços ou dentro de si mesmas, por outras pessoas, afim de que não sejam descobertas por outros olhares. Colasanti consegue representar muito bem isso no conto.
Enfim, a moça tecelã está presente nas mães, filhas, empresárias, donas-de-casa e esposas de todos os dias, e não é por obra do acaso que a mulher continua sendo um ser misterioso e intrigante, presente sempre no mundo literário.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

As mulheres de Marina Colasanti



Patrícia Adriana Corrente

Marina Colasanti é uma das escritoras mais importantes da literatura brasileira, palestrante requisitada, ensaísta, contista, autora e um dos maiores nomes em termos de escrita feminina, dentre suas obras destacam-se as coletâneas de contos: Penélope manda lembranças, O Leopardo é um animal delicado, Contos de amor rasgados, dentre outras. Nesse artigo irá se observar a postura e papel de três personagens femininos em três contos de Colasanti: “Para que ninguém a quisesse”, “A moça tecelã” e “Luz de lanterna, sopro de vento”, respectivamente das coletâneas de contos: “Contos de um amor rasgado”; “Doze reis e a moça no labirinto do vento” e “Um espinho de marfim e outras histórias”.
Colasanti procura discutir comportamentos estigmatizados dentro da cultura há séculos, que sugerem um papel secundário à mulher e diversos âmbitos sociais, sua obra assim caracteriza-se como representação da experiência social feminina. A autora crê que vai se levar mais de um século para se modificar a maneira como os homens retrataram a mulher ao longo dos anos e essa tarefa caberá às escritoras. Marina Colasanti combate a escrita feminina “mulherzinha” que não é a melhor maneira de retratar a mulher, pois assim assemelha-se a uma caricatura, algo cômico, assim a mulher  não marca presença no mundo literário. Com sua sensibilidade, Colasanti explora os abismos da alma feminina, suas obras provocam a reflexão, uma viagem dentro de nós mesmos, evoca os sentimentos, as relações, as realidade do cotidiano, isso a tornando uma escritora que proporciona uma identificação com seu leitor.

A análise das personagens femininas nesse trabalho se dará por meio de um tipo de narrativa, o conto:

“É uma narrativa mais curta que tem como característica central condensar conflito, tempo, espaço e reduzir o numero de personagens. O conto é um tipo de narrativa tradicional [...], ainda que tenha adquirido características diferentes, por exemplo, deixar de lado a intenção moralizante a adotar o fantástico ou o psicológico para elaborar o enredo”.
(GANCHO,2004)

A partir dos contos dar-se-á a análise das personagens com base na representação da mulher, do Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa: REPRESENTAÇAO, S. J. Ato ou efeito de representar; exibição; coisa que se representa; reprodução do que se tem na ideia; [...] (FERREIRA, 1968); a autora tem em mente a ideia da mulher ou de várias delas, e a representa em seus personagens.
Mulheres de diferentes papéis são representadas na obra de Marina Colasanti, a diversificação de características em suas personagens torna  seu trabalho com caráter verossímil.
A escrita feminina tem suas particularidades, pois denota maior sensibilidade às questões exteriores, assim como às questões internas e psicológicas da mulher. Anteriormente a mulher era representada pelo “olhar” masculino, ou seja, o feminino era retratado de acordo com a maneira mais apropriada ao homem, salvo quando escritoras utilizavam pseudônimos para divulgar suas obras.

“Para que ninguém a quisesse”

 O conto “Para que ninguém a quisesse” é composto por duas personagens, que se apresentam como “o homem” e “a mulher”. Nesse momento, a autora traz uma mulher como muitas, de certa forma ela aproxima o conto da vida pessoal do leitor.
Como muitas outras a personagem feminina, no conto, é limitada aos caprichos do marido, ele é exigente: “[...], e ele, foi obrigado a exigir que eliminasse os decotes [...]”, é claro que nesse trecho a “obrigação”que o homem sentia em repreender a mulher, surgia, a medida que ele observava olhares para sua esposa, sentia medo de perdê-la para outro homem.
O homem notava que sua mulher chamava muito a atenção dos demais homens, pela sua beleza, graciosidade, enfim, tratou de desbotá-la, deu fim aos artifícios para que ficasse “feia”, ela como esposa submissa, passiva, “obedeceu” às ordens do esposo, este que não lhe dava outra opção. A mulher perdeu seu brilho, sua vivacidade, transformou-se apenas em mais um objeto da casa, de uso de seu marido. O homem, como todo outro homem, deixou também de olhá-la, quis trazer de volta o seu desejo, não sua mulher, sua autenticidade, mas necessitava sentir desejo por ela novamente. E quando disso se deu conta, quis presenteá-la por meio de artifícios, para que seu desejo se reascendesse. A mulher, apática, não mais sentia motivação para ser ela mesma, e não sentia mais a necessidade de estar bela, sentiu em certo momento essa necessidade, mas fazia para seu marido, e quando para ele, ela “estar bela” não foi interessante, da vontade dele, fez a sua e se acomodou, aceitando o capricho do marido.
Há muito tempo a visão de que a mulher deve submissão ao homem esta presente, Russeau dizia “a mulher é destinada ao casamento e à maternidade”, apesar de a mulher ser amparada por lei, o preconceito e os paradigmas estão ainda incrustados em nossa cultura. A Constituição Federal de 1988, afirma que:

Art. 226. [...] § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

O que se subentende pela lei, é que a mulher tem os mesmos direitos que o homem, mas não é o que se vê no cotidiano, mulheres como a do conto “Para que ninguém a quisesse” passam por situações parecidas diariamente, sob o olhar atento dos maridos, sem poder desenvolver seu lado psicológico e social, mulheres que se quer  podem manter relações com o mundo exterior que não o de casa. Del Priore afirma que: na sociedade tradicional e conservadora, a mulher não tem estatuto sozinha, ou seja, fora do casamento. O casamento “é a única instituição que lhe permite realizar-se enquanto ser social” (DEL PRIORE, 1995:141), isso nos transmite a ideia de que a mulher não é um ser, mas sim um ser que depende do homem para desenvolver-se nos diversos âmbitos sociais.

“Moça tecelã”

Colasanti retrata um outro tipo de perfil feminino nesse conto, por recursos de uma fábula, a mulher independente que constrói a cada dia seus sonhos, a mulher que se basta por si mesma, que consegue perceber interferência negativa do homem em sua vida, e muda a situação a tempo.
A moça, no conto, é delicada, sensível, criativa, simples, não tem ganância, vive feliz em sua vida, dependendo afetivamente e socialmente só de si mesma. Ao fazer seu tempo e seu espaço, a moça traz, constrói, a necessidade de companhia, de um homem para crescer ao seu lado; ela trouxe alguém para a sua vida, um companheiro, talvez porque, a sociedade a impôs isso, a presença de um homem na vida de uma mulher, ela achou que realmente precisasse.
O homem, ambicioso, ganancioso, dominador e autoritário, entrou na vida da moça, com todos os seus desejos, não os mesmos da moça, mas, desejos materiais, não os de felicidade, mas de enriquecimento supérfluo. A moça moldou um homem para si, da maneira que viesse, usufruindo de suas qualidades e virtudes para seu bem próprio, sua satisfação pessoal, a moça por algum tempo, submeteu-se aos caprichos do marido, fez para agradar, mas já não tinha vida, vivia para ele, perdeu sua identidade, sua autenticidade, simplicidade.
Percebeu, então, que o homem em nada havia acrescentado em sua vida, mas pelo contrario, deteve sua liberdade em se apressar, seus sonhos ele não valorizou, suas vontades ele fez como se não tivesse ouvido. A moça teve a autonomia de tomar sua vida para si, “desfez”o homem de sua vida, se impôs e voltou a sua antiga vida, onde era realmente feliz e realizada, sem a necessidade de um homem.
O homem, não a desejava, mais sim, tudo o que ela podia lhe proporcionar, lhe oferecer com seu mágico poder de tecer a vida, ele não admitiu a moça ter esse poder, não lhe cabe, o homem sentiu-se ameaçado, enclausurou-a, mas não se deu conta que ela ainda tinha consciência do que acontecia e de sua insatisfação.
A Moça tecelã é a representação da mulher autônoma, que vai à busca de seus objetivos, é o retrato da mulher que não se cala, não se acomoda e nem se submete à possível “autoridade” masculina.

“Luz de lanterna, sopro de vento”

Nesse conto, a personagem feminina apresenta-se como a representação da mulher que ama, que espera por seu homem, não de maneira submissa, dependente, mas sim, o amor que cuida, o amor que sente falta e se preocupa.
A figura feminina representada no conto “Luz de lanterna, sopro de vento” difere-se das duas anteriores personagens já mencionadas e é possível compará-la com a moça de “Moça tecelã”, verificando assim características antagônicas. A mulher nesse conto é o retrato da mulher apaixonada, que ama “seu homem”, sente sua falta e precisa de sua presença; sua posição indica um caráter servil, de submissão, porém, essa característica se difere da mulher apresentada no conto “Para que ninguém a quisesse”, pois essa é submissa e passiva, mas não se sente feliz com sua posição, ao contrário daquela que assume sua posição com gosto, sente satisfação em ser a mulher de um homem, em amá-lo.
O conto sugestiona uma metáfora com os antigos contos de fada, onde a “princesa” (mulher) espera pelo príncipe encantado que vem a cavalo ao seu encontro, para que vivam felizes para sempre. Ainda há a idéia de propriedade nos termos de tratamento utilizados no conto como: “seu homem”; “seu marido”; “o marido”, “a mulher”.
A lanterna acesa toda noite pela mulher é a simbologia da necessidade da presença do marido, da demonstração de seu amor, a imposição de seu retorno para cara, para que voltasse para ela e não para outra mulher. Em seu primeiro retorno o homem se apresenta duro e ríspido, em decorrência da guerra, pedindo que não mais acendesse a lanterna, pois a falta que a mulher sentia dele o impedia de cumprir seu dever de guerreiro.  O distanciamento dos dois simbolizados pela lanterna não mais acesa modifica a relação temporal, os dias e noites passam rápidos para ambos, para que em seu definitivo retorno, o homem traga suas antigas características: “contorno doce”, “sem couraça”, “retendo o sorriso nos lábios”. Ainda na noite de seu retorno, o homem “acende a lanterna” porque naquela noite não queria dormir, mas sim reconciliar-se com sua mulher, manteve a lanterna acesa para que o  brilho da luz o chamasse até sua mulher.
A mulher nesse conto ama incondicionalmente seu homem, mas respeita sua vontade, dedica-se a ele, e o espera, ela sabe que ele voltará, tem a certeza da reciprocidade de seu amor, essas características levam-na à um perfil submisso e servil, porém, para a mulher essa posição é agradável e satisfatória, seu amor lhe basta.


Referências:

CAVALCANTE, Betânia Carreiro – A opressão da mulher. Mulher em questão. Maceió: Universidade Federal de Alagoas, 1987. p 59 – 62.

MURARO, Rose Marie – Conclusão: A mulher no terceiro milênio. A mulher no terceiro milênio: uma história da mulher através dos tempos e suas perspectivas para o futuro. Rio de Janeiro: 3º ed. Rosa dos Tempos, 1993, p 191 – 199.

COLASANTI, Marina. “Luz de lanterna, Sopro de vento”. In: Um espinho de marfim e outras histórias.  Porto Alegre: L & PM, p. 39, 1999.

COLASANTI, Marina. “Para que ninguém a quisesse”. In:  Contos de amor rasgados. Rio de Janeiro: Rocco, 1986, p. 111 – 2.

COLASANTI, Marina. “A moça tecelã”. In Doze reis e a moça no labirinto do vento. Rio de Janeiro: Global Editora, 2000.