quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Barthes e a morte do autor


Patrícia Adriana Corrente

           Num contexto de escritura de uma obra literária, a ideia de morte do autor remete à destruição de toda voz, todo sujeito subjetivo que ressoa pelos ouvidos da escrita. A partir do momento em que o autor morre, a obra inicia sua própria escritura. Para que isso ocorra, o autor deve ser encarado como um mediador da escrita e não como autor daquelas palavras.
            Porém, ele ainda é muito solicitado em biografias, entrevista e na consciência dos literatos que teimam em juntar a pessoa e a obra, busca-se ainda uma ’explicação’ da obra como se apenas a voz do autor ressoasse na obra. Mallarmé na França iniciou o trabalho de dar à língua e à linguagem o seu lugar na confecção de uma obra literária, dando ao autor uma impessoalidade. Proust não se doou em suas obras, mas retirou dos romances sua própria vida.
            Com o Surrealismo, a ideia de autor teve pouca importância, ao subverter o código (língua), a escrita era menos formal, mais automática, menos inspiradora, fruto de uma experiência coletiva, de vários “eus”. Partindo para um argumento linguístico onde é visto que a enunciação fala por si só, sem que haja a necessidade de preenchê-la com a pessoa do interlocutor, perde-se a “pessoa” e ganha-se o “sujeito” e este basta para a linguagem, o que acaba também por “matar” o autor.
            Quando se acredita no autor, levando em conta uma concepção temporal, vê-se nele um passado que vive antes de sua obra, a relação entre obra e autor é a de um pai para seu filho, e já no texto moderno o autor é visto como alguém que nasce com sua obra, ele existe no tempo da enunciação do texto, o texto é escrito aqui e agora, nesse sentido a escrita não é mais uma espécie de registro biográfico do autor.
            O texto é um emaranhado de outros textos que conversam entre si para não produzir um sentido único, mas vários. Ele é composto por várias citações extraídas das muitas culturas, o que o texto diz pelas mãos do escritor é sempre o que já foi dito em algum momento sempre anterior, e sua fala nunca é original. Dar autoria ao texto é dar-lhe um único significado, uma explicação. A partir do momento em que se crê na escritura múltipla, não há nada para ser decifrado, não há segredo a ser descoberto e por fim ocorre a recusa a "deus".
            O texto é a fonte de várias escrituras, de várias vozes que dialogam entre si e se reúnem num só lugar, que não é o do autor, mas o do leitor, este que também traz as suas escritas e suas leituras, a unidade do texto está em seu destino: o do ouvinte final. Pouco se deu importância à figura do leitor, mas muito à figura do autor. Com a morte do autor, nasce o leitor.

Referência:
BARTHES, Roland. O Rumor da Língua. A morte do autor.

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